segunda-feira, 3 de junho de 2013

Pão com Fanfaní, cozinha artesanal 
- eis o motivo das minhas noites sem dormir. 



















Não, não é caso de insônia, tampouco de remédio, doutor. É que sábado é dia de feira lá em Macacos, e as oito da manhã o carro precisa estar carregado e a caminho da vila.. e é muito bolinho e muita torta pra arrumar, sabe? 
Não, não é caso de reclamar, não doutor. Pelo contrário, eu to aqui te contando, porque me falaram que daqui pra frente eu preciso falar do meu pequeno negócio com todas as pessoas que eu conversar, falar da feira de sábado e das encomendas que eu entrego durante a semana lá em Macacos e aqui em Belo Horizonte. É, é.. é marketing! Divulgação é a alma do negócio. Me falaram que eu preciso contar até dos embrulhos de torta de banana integral que eu venho equilibrando no ônibus pra Belo Horizonte nos dias de entrega, acredita? É que  tem pessoas que gostam de saber das histórias que tem o alimento que elas comem. O bom é que eu gosto de contar, até porque eu sou parte das pessoas que gostam de saber.

Essa marmitinha aí que eu trouxe pro senhor experimentar, doutor, foi a minha novidade pra essa semana lá na feira. É um crocante de maçã e amêndoas! Sabe, eu decidi ter três receitas fixas e uma que varia, porque assim meus clientes sabem com o que podem contar e sabem também que podem esperar algum novo experimento da minha cozinha artesanal. Minha mão doceira inquieta fica feliz de poder fazer uma nova receita e eu ainda consigo aumentar o movimento da minha barraquinha anunciando a novidade da semana.   É, é.. é marketing! Criatividade é a alma do negócio.

Então, voltando ao assunto das minhas noites sem dormir.. eu sei que não posso sustentar esse ritmo por muito tempo. Mas sabe que nem é falta de planejamento não, eu me organizo direitinho. Segunda e terça compro embalagens e ingredientes secos no centro, quarta vou ao supermercado e sexta é o dia de pegar os produtos locais, comprar a carne moída pro quibe e assar toda a produção pra feira. Uai?! Eu não mencionei o quibe?! O quibe é a terceira receita fixa e por enquanto é também a única receita salgada. Ele é de abóbora japonesa e carne, temperado com noz moscada e pimenta,  e com salsinha e cebolinha da minha vizinha lá de Macacos. O ovo que ajuda a dar a liga na massa também é de lá, ovo caipira de galinha criada solta no terreiro.. pura saúde. É, eu sei.. e essa é uma questão que está em estudo. Vegetarianos , como você, também freqüentam a minha barraquinha e já me encomendaram uma receita salgada sem carne.. que eu até fiz pra esse sábado, mas não pude vender. O quibe desmoronava toda vez que eu tentava partir.. desisti na terceira tentativa, e olha que eu não costumo desistir fácil, você sabe. Acho que foi resultado da falta do ovo que eu decidi tirar da massa, com o recheio que não era dos mais molhadinhos..  dava pra vender como tabule, mas preferi esconder e elaborar melhor pro posso sábado. Descobri um cara que cultiva cogumelos shimeji num lugar perto de Macacos e to pensando em criar a receita vegetariana com esses cogumelos, que tal? É, eu sei que o senhor gosta.. pode contar que vou trazer um pedacinho especial pra sua degustação.

O que eu acho mais legal é justamente isso, sabe? Ter ingredientes frescos, das redondezas de Macacos e de pequenos produtores como eu. A minha idéia pro meu pequeno negócio é criar receitas que usem a maior quantidade possível de ingredientes locais e orgânicos, produzidos por pessoas que eu sei o nome, sei onde moram e sei que quando eu tiver precisando conversar, possivelmente, iram me convidar pra uma xícara de café. É, eu gosto de vender comida com vínculos! Gosto de comprar de pessoas de bem e de vender pra pessoas de bem; pessoas que assim como eu acreditam na importância do alimento, no cuidado com a saúde por meio de uma alimentação mais integral e natural e principalmente na importância de poder desfrutar de um bolinho de chocolate com doce de leite caseiro, sem grandes preocupações, se permitindo ter prazer e saciar as diferentes fomes do corpo e da alma. É um pouco piegas falar assim, mas é que eu coloco tanto amor nas coisas que saem da minha cozinha que eu fico achando que meus bolinhos e tortas podem melhorar e alegrar os dias das pessoas. 
E é por isso que eu mesma é que assumo as vendas lá na feira todo sábado, porque posso contar um pouco de tudo o que acontece até que um bolinho esteja ali, porque posso ouvir um pouco o que as pessoas tem pra falar, me encher de expectativas todas as vezes que elas iniciam uma primeira mordida e ainda voltar pra casa com um dinheirinho no bolso que me deixa feliz, feliz..

Trabalhar é tudo o que eu mais tenho gostado de fazer, doutor. Passar minhas noites tirando do forno, recheando e embalando bolinhos. Picando banana madura numa mesma espessura e enfileirando ordenadamente os pedaços sobre a massa, em meio a livros de receitas e potes de ingredientes, esperando um galo que canta as quatro da manhã anunciar que é hora de preparar uma xícara de café, lavar o rosto e começar um novo dia..                      

Contando assim, me parece vida invejável de personagem de romance culinário. Na prática, continua tendo muito beleza, mas talvez fosse mesmo prudente reservar um pouco mais de horas de sono, pra que a pele esteja um pouco mais descansada e eu economize as vindas ao dermatologista.